terça-feira, dezembro 21, 2010




"Enquanto o fio da catana 
avançava sobre o medo encurralado
o mundo espreguiçava uma pálpebra-hesitava…
Ruanda ainda conta os crânios dos seus filhos."


A poeta santomense São Lima está a ser vítima de silenciamento em S.Tomé. O primeiro ministro incomodado com a sua frontalidade deu ordens para que o contrato de São Lima com a televisão não fosse renovado de maneira a silenciar o programa de televisão que ela assina "Em Directo" .
A também santomense Inocência Mata escreveu: "Fala-se de “uma atitude prejudicial para com a imagem do Estado Santomense” e acrescenta "Desde quando é que a função de um jornalista deve depender da “imagem” do Estado?!! A função do jornalista é informar e não informar de acordo com o “patriotismo”. Este é, aliás, um equívoco em que incorrem políticos de cultura e mentalidade muito pouco democráticas, que pensam que um jornalista deve seleccionar informação de acordo com a imagem que vai dar do país."
S.Tomé, um estado insular é um país muito pequeno de 150.000 habitantes. São Lima com uma experiência de mais de 20 anos na BBC em Londres, especialista em Estudos Africanos, com mestrado no Kings College e a maior poeta viva de São Tomé e uma das maiores da poesia contemporânea em língua portuguesa e de África, é demasiado grande para as mentalidades atrofiadas das elites no poder em S. Tomé. O desemprego atira-a de novo para os caminhos da diáspora. Vamos deixar que a devorem sem pelo menos expressarmos a nossa solidariedade? Creio que é o momento de mostrarmos que ela não está sozinha a lutar pela liberdade de imprensa e informação, pela nossa liberdade. Subscrevam o abaixo-assinado por favor, Margarida Paredes






A Casa


Aqui projetei a minha casa:
alta, perpétua, de pedra e claridade.
O basalto negro, poroso
viria de Mesquita.
Do Riboque o barro vermelho
da cor dos ibiscos
para o telhado.
Enorme era a janela e de vidro
que a sala exigia um certo ar de praça.
O quintal era plano, redondo
sem trancas nos caminhos.
Sobre os escombros da cidade morta
projetei a minha casa
recortada contra o mar.
Aqui.
Sonho ainda o pilar –
uma retidão de torre, de altar.
Ouço murmúrios de barcos
na varanda azul.
E reinvento em cada rosto fio
a fio
as linhas inacabadas do projeto.


***

A senhora Malanzo era velha, muito velha.
A senhora Malanzo era pobre, muito pobre.
Não tinha filhos, não tinha netos
Não tinha sobrinhos, não tinha afilhados
Nem primos tinha, nem enteados.
Era muito pobre e muito velha
Muito velha e muito pobre era
Era velha, era pobre a senhora Malanzo.
Pobre e muito velha
Velha e muito pobre
Era velha e pobre
Era pobre e velha
Velha pobre
Pobre velha
Velha
Pobre
Feiticeira
(Conceição Lima, A lenda da feiticeira)

Um comentário:

  1. Que absurdo!
    Já assinei, e vou a buscar novos adeptos.
    Nena Barros de Pais- Coimbra

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Obrigada por sua visita!
Boas Leituras.